Contudo, é admissível pensar que existe uma espécie de grandeza em Heróstrato — uma grandeza que ele não partilha com arrivistas menores que irromperam na fama inopinadamente. Sendo grego, pode conceber-se que possuía a percepção refinada e o calmo delírio da beleza que ainda distinguem a memória do seu clã de gigantes. É, pois, concebível que tenha incendiado o templo de Diana num êxtase de dor, queimando parte de si mesmo na fúria da sua malvada façanha. Podemos legitimamente conceber que tivesse superado os apertos de um remorso futuro, e enfrentado um horror íntimo para alcançar uma fama duradoura.
(Fernando Pessoa, “Heróstrato ou o futuro da celebridade”,
Prosa Íntima e de Autoconhecimento, p. 362; em inglês no original)