27 fevereiro 2010

Arte e patriotismo

Em arte tudo é lícito, desde que seja superior. Não é permitido ao homem vulgar ser antipatriota, porque não tem mentalidade acima da espécie, e a não pode ter pois acima da espécie imediata, que é a nação a que pertence. Ao génio é permitido. Sucede, por ironia, que os grandes génios são em geral conformes com os sentimentos normais: Shakespeare era intensamente, até excessivamente, patriota.

Um génio antipatriota é um fenómeno, não direi vulgar, mas aceitável. Um operário antipatriota é simplesmente uma besta.

(Fernando Pessoa, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, VI, 11, p. 130)

24 fevereiro 2010

Incompetência e Corrupção

E todos os chefes de estado, incompetentes ao léu, barris de lixo virados p’ra baixo à porta da Insuficiência da Época!
Tirem isso tudo da minha frente!
Arranjem feixes de palha e ponham-nos a fingir gente que seja outra!
Tudo daqui para fora! Tudo daqui para fora!
Ultimatum a eles todos, e a todos os outros que sejam como eles todos!
Se não querem sair, fiquem e lavem-se!

(Álvaro de Campos, “Ultimatum”, Prosa Publicada em Vida, p. 280)

21 fevereiro 2010

Dia Internacional da Língua Materna

Minha pátria é a língua portuguesa.

(Bernardo Soares, Livro do Desassossego, 259, p. 255)

85 anos da publicação do primeiro número da revista The New Yorker (1925)

livros: Flaubert, Pessoa, Mann, Prévert, García Lorca, E. A. Poe
Ilustração de Benoît van Innis
para a revista The New Yorker

162 anos do Manifesto do Partido Comunista (1848)

Ao contrário do catolicismo, o comunismo não tem uma doutrina. Enganam-se os que supõem que ele a tem. O catolicismo é um sistema dogmático perfeitamente definido e compreensível, quer teologicamente, quer sociologicamente. O comunismo não é um sistema: é um dogmatismo sem sistema — o dogmatismo informe da brutalidade e da dissolução. Se o que há de lixo moral e mental em todos os cérebros pudesse ser varrido e reunido, e com ele se formar uma figura gigantesca, tal seria a figura do comunismo, inimigo supremo da liberdade e da humanidade, como o é tudo quanto dorme nos baixos instintos que se escondem em cada um de nós.

O comunismo não é uma doutrina porque é uma anti-doutrina, ou uma contra-doutrina. Tudo quanto o homem tem conquistado, até hoje, de espiritualidade moral e mental — isto é de civilização e de cultura —, tudo isso ele inverte para formar a doutrina que não tem.

(Fernando Pessoa, Textos Filosóficos, vol. I, IV, 50, pp. 141–142)

18 fevereiro 2010

464 anos da morte de Martinho Lutero (1546)

A mais nítida obra civilizacional alemã do passado foi a Reforma. [...]

(Fernando Pessoa, Ultimatum e Páginas de Sociologia Política, 29, p. 202)

16 fevereiro 2010

Carnaval

Escultura de António

14 fevereiro 2010

Dia dos Namorados

[...] decidi abdicar do amor como de um problema insolúvel.

(Barão de Teive, A Educação do Estóico, p. 22)


Pessoa com coração no colarinho
Aguarela de Hermenegildo Sábat
(Fonte: Público)

Amor

Love is a mortal sample of immortality.

[ O amor é uma amostra mortal da imortalidade. ]

(Fernando Pessoa, Aforismos e afins, p. 45
Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal,
comunicação mediúnica n.º 74, p. 326; em inglês no original)


Aimer c’est s’y méprendre.

[ Amar é equivocar-se. ]

(Fernando Pessoa, Aforismos e afins, p. 46; em francês no original)

Amor à dobrada

Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
Dobrada à moda do Porto fria?

(Álvaro de Campos, “Dobrada à moda do Porto”, Poesia, 198, p. 510)

11 fevereiro 2010

152 anos da primeira “aparição” de Lourdes (1858)

O deplorável facto de que uma menina chamada Bernadette Soubirous se antecipara [...] a esta notável visão do celestial terrestrizado, despe-nos um pouco o manto, e um pouco nos entorta a coroa, da novidade. Enfim sempre era mesmo de uma Nossa Senhora geograficamente (e cronologicamente) diferente. Já o Chevalier de Cailly perguntava, no século [dezoito], dado que sempre que escrevia qualquer coisa, descobria que a Antiguidade a já havia dito, por que não teria essa tal Antiguidade vindo depois dele, pois então teria ele escrito primeiro.

(Fernando Pessoa, “Fátima”, Fernando Pessoa: O Guardador de Papéis, p. 275)

09 fevereiro 2010

Ensinamentos das religiões

Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.

(Álvaro de Campos, “Tabacaria”, Poesia, 75, p. 323)

07 fevereiro 2010

532 anos do nascimento de Thomas More (1478)

Que tragédia não acreditar na perfectibilidade humana!...
— E que tragédia acreditar nela!

(Bernardo Soares, Livro do Desassossego, 288, p. 276)

Iconografia pessoana

Fachada da Embaixada Portuguesa
em Sófia (Bulgária)

06 fevereiro 2010

402 anos do nascimento de Padre António Vieira (1608)

Imperador da língua portuguesa,

(Fernando Pessoa, “António Vieira”, Mensagem, Terceira Parte, II, p. 175)

03 fevereiro 2010

522 anos do desembarque de Bartolomeu Dias na Aguada de São Brás (Mossel Bay) após dobrar o Cabo das Tormentas, ou da Boa Esperança (1488)

O MOSTRENGO


O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse, «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»

«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»

(Fernando Pessoa, Mensagem, Segunda Parte, IV, pp. 133–135)

01 fevereiro 2010

102 anos do Regicídio de D. Carlos (1908)

A maravilhosa beleza das corrupções políticas,
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,
Agressões políticas nas ruas,
E de vez em quando o cometa dum regicídio
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana!

(Álvaro de Campos, “Ode Triunfal”, Poesia, 8, pp. 83–84)



O Regicídio, e, depois, a Revolução, foram os dois fenómenos que chamaram sobre nós, embora imperfeitamente, a atenção do estrangeiro. Quer dizer: em vez de desconhecidos, passámos a ser mal conhecidos. Antes, nada se sabia de nós; passaram a saber-se de nós coisas inteiramente falsas. O conhecimento que o estrangeiro tem de nós oscila entre o nada e o erro.

(Fernando Pessoa, Pessoa Inédito, 175, p. 309)

Pessoa, sempre — todos os dias: Fevereiro de 2010

Calendário pessoano: Fevereiro de 2010
Os ícones de cada dia foram adaptados dos do Labirinto do site MultiPessoa.