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14 julho 2012

223 anos da Tomada da Bastilha (1789)

As revoluções, como vimos, baseiam-se num sentimento forte de injustiça, sentimento que se torna geral. Ora um sentimento geral e forte de injustiça gera por força ideias absurdas. Em 1.º lugar, um sentimento forte é uma condição negativa para a lucidez; quem estuda apaixonadamente (salvo no sentido de entusiasmo intelectual) um problema, estuda-o sempre mal. Em 2.º lugar, um sentimento de injustiça envolve sempre um ódio ou rancor a quem a pratica; e a teoria nascida, ou adaptada, por esse sentimento tenderá fatalmente a ser excessiva no sentido contrário — não só a desfazer a injustiça, como a castigá-la, isto é, a ferir e vingar-se nos que a praticam, ou se supõe que a praticam. Resultará uma teoria tão injusta como a prática a que essa teoria se contrapõe. Em 3.º lugar, os problemas que uma revolução busca resolver são sempre problemas sociais, todos, por natureza, de uma grande complexidade. Ora, uma teoria de contra-injustiça, para ser geralmente sentida, tem que ser simples; porque o geral da humanidade não pode compreender ideias complexas. A teoria tem portanto que ser inadaptável à complexidade do problema.

(Fernando Pessoa, Ultimatum e Páginas de Sociologia Política, 48, pp. 258–259)

22 junho 2012

379 anos da condenação de Galileu Galilei pelo Tribunal do Santo Ofício (1633)

[...] a crítica da atmosfera religiosa produz maiores espíritos que aquela que se exerce no vácuo. Kant assim surgiu.

A desastrada argumentação que citaria para o caso as circunstâncias que oprimiram Galileu e Servet, esqueceria sem dúvida que estava confundindo o predomínio religioso com a falta de civilização. São dois factos que importa não confundir. Se nós víssemos que nesses tempos as penalidades criminais eram de uma suavidade enorme, que eram de uma leniência acentuada as sentenças dos juízes, e que ao mesmo tempo esses hereges aparecessem queimados, enforcados, mortos, seria então o caso de atribuir à religião uma culpa que ela efectivamente teria. Mas a religião defendia-se, como é natural, e defendia-se com as armas do tempo; com as mesmas armas com que se defendia qualquer estado. [...]

(Fernando Pessoa, Pessoa por Conhecer, vol. II, 235 , p. 282)

15 janeiro 2012

Onde se lê «Sr. José Cabral», leia-se «Ministra Paula Teixeira da Cruz»

[...] Creio não errar ao presumir que o Sr. José Cabral supõe que a Maçonaria é uma associação secreta. Não é. A Maçonaria é uma Ordem secreta, ou, com plena propriedade, uma Ordem iniciática. O Sr. José Cabral não sabe, provavelmente, em que consiste a diferença. Pois o mal é esse — não sabe. Nesse ponto, se não sabe, terá que continuar a não saber. De mim, pelo menos, não receberá a luz. Forneço-lhe, em todo o caso, uma espécie de meia luz, qualquer coisa como a «treva visível» de certo grande ritual. Vou insinuar-lhe o que é essa diferença por o que em linguagem maçónica se chama «termos de substituição».

A Ordem Maçónica é secreta por uma razão indirecta e derivada a mesma razão por que eram secretos os Mistérios antigos, incluindo os dos cristãos, que se reuniam em segredo, para louvar a Deus, em o que hoje se chamariam Lojas ou Capítulos, e que, para se distinguir dos profanos, tinham fórmulas de reconhecimento — toques, ou palavras de passe, ou o que quer que fosse. Por esse motivo os romanos lhes chamavam ateus, inimigos da sociedade e inimigos do Império — precisamente os mesmos termos com que hoje os maçons são brindados pelos sequazes da Igreja Romana, filha, talvez ilegítima, daquela maçonaria remota.

(Fernando Pessoa, “Associações Secretas”, Da República (1910–1935), 132, pp. 394–395)

23 agosto 2011

Dia Europeu de Recordação da Vítimas dos Regimes Totalitários e Autoritários

Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé,
E ninguém sabe porquê.

(Fernando Pessoa, Poesia (1931–1935 e não datada), p. 380)

18 julho 2010

Igreja Católica atribui a mesma gravidade à pedofilia e à ordenação de mulheres como padres

Maldita seja em toda a parte
A Igreja Católica
Maldita seja, com arte ou sem arte,
A Igreja Católica
E quando alguém por apanhar ar
Tiver uma cólica
E sinta preciso aliviar
Lembre-se sempre de bem cagar
Para a Igreja Católica.

Maldita seja, de rabo à vela,
A Igreja Católica
De toda retrete que seja capela
A Igreja Católica
Há só duas coisas a fazer para aquela
Igreja Católica
Cagar p’ra ela e mijar p’ra ela
Para a Igreja Católica.

Caguemos pois e tudo junto
Para a Igreja Católica
Até que o caso dê assunto
À Igreja Católica
Cagar também, também por cólica
Então ver-se-á e será ouvido
O que tem comido, e o que tem bebido,
O que tem sorvido e engolido
A Igreja Católica.

(Joaquim Moura Costa, Pessoa por Conhecer, vol. II, 177, pp. 221–222.)



Notícia relacionada:
«Ordenamento de mulheres é crime a par da pedofilia para o Vaticano» (Público, 16/07/2010)

12 janeiro 2010

579 anos do início do julgamento de Joana d’Arc por bruxaria (1431)

Não uma santa estética, como Santa Teresa,
Não uma santa dos dogmas,
Não uma santa.
Mas uma santa humana, maluca e divina,
Materna, agressivamente materna,
Odiosa, como todas as santas,
Persistente, com a loucura da santidade.
Odeio-a e estou de cabeça descoberta
E dou-lhe vivas sem saber porquê!
[...]
Bruxa de boa intenção...

[...]

Minha Joana de Arc sem pátria!
[...]
Estúpida como todas as santas
E militante como a alma que quer vencer o mundo!

(Álvaro de Campos, “Carry Nation”, Poesia, 123, pp. 399–400)

30 julho 2009

Crítica literária

A crítica, de resto, é apenas a forma suprema e artística da maledicência. É preferível que seja justa, mas não é absolutamente necessário que o seja. [...]

[...] Espetar alfinetes na alma alheia, dispondo esses alfinetes em desenhos que aprazam à nossa atenção futilmente concentrada, para que o nosso tédio se vá esvaindo — eis um passatempo deliciosamente de crítico, e ao qual juramos fidelidade.

(Fernando Pessoa, “Balança de Minerva — Aferição”, Crítica, pp. 91–92)

Crítica literária “bulldozer”

Destina-se esta secção à crítica dos maus livros e especialmente à crítica daqueles maus livros que toda a gente considera bons. O livro, consagrado por qualidades que não tem, do homem consagrado por qualidades com que outros o pintaram; o livro daquele que, tendo criado fama, se deitou a fingir que dormia; o livro do que entrou no palácio das musas pela janela ou colheu a maçã da sabedoria com o auxílio dum escadote — tudo isto se pesará na Balança de Minerva.

[...] pretendemos dar a entender que o nosso uso da Balança de Minerva limitar-se-á, na maioria dos casos, a dar com ela — pesos e tudo — na cabeça do criticado. Isso, de resto, não deve preocupar ninguém. Quem tiver de ser imortal pode sê-lo mesmo com a cabeça partida. [...]

(Fernando Pessoa, “Balança de Minerva — Aferição”, Crítica, pp. 91–92)

17 julho 2009

Dia Mundial para a Justiça Internacional

[...] A injustiça, aliás, é a justiça dos fortes. [...]

(Fernando Pessoa, “Balança de Minerva — Aferição”, Crítica, p. 91)