31 março 2013

Quatro anos. Valete, Fratres!

«Não cites Fernando Pessoa em vão.»
Stencil de autor desconhecido (Bairro Alto, Lisboa)
Fotografia de Pedro Jubilot


O primeiro post deste blogue, reza a lenda, foi publicado há precisamente 4 anos. O objectivo a que nos propúnhamos era mostrar que «o “Universo Pessoa” é tão vasto, que seria possível citá-lo a propósito de quase tudo» (e, pensando bem, também a propósito de nada). Após 905 posts, em contexto ou fora dele, cremos bem que o conseguimos. Pelo caminho, esperamos ter estimulado alguém a ler Pessoa(s): nunca é em vão. (O mais provável, porém, é termos estado apenas a falar para uns poucos já “convertidos”.)

Quatro anos é muito tempo. Quatro é também um número apropriadamente pessoano: Caeiro, Reis, Campos, Pessoa.

Este blogue acaba aqui. Valete, Fratres!


Maria Filomena + Fernando Gouveia

(Fernando Pessoa, “Nevoeiro”, Mensagem, Terceira Parte, III, p. 191)

Páscoa chuvosa

Ilumina-se a igreja por dentro da chuva deste dia,
E cada vela que se acende é mais chuva a bater na vidraça...

Alegra-me ouvir a chuva porque ela é o templo estar aceso,
E as vidraças da igreja vistas de fora são o som da chuva ouvido por dentro...

O esplendor do altar-mor é o eu não poder quase ver os montes
Através da chuva que é ouro tão solene na toalha do altar...
Soa o canto do coro, latino e vento a sacudir-me a vidraça
E sente-se chiar a água no facto de haver coro...

A missa é um automóvel que passa
Através dos fiéis que se ajoelham em hoje ser um dia triste...
Súbito vento sacode em esplendor maior
A festa da catedral e o ruído da chuva absorve tudo
Até só se ouvir a voz do padre água perder-se ao longe
Com o som de rodas de automóvel...

E apagam-se as luzes da igreja
Na chuva que cessa...

(Fernando Pessoa, “Chuva Oblíqua, II”, Poesia (1902–1917), p. 215)

Mudança para a hora de Verão

«Hora Absurda»
Desenho de Cruzeiro Seixas

(Fernando Pessoa, “Hora Absurda”, Poesia (1902–1917), pp. 180–183)

29 março 2013

Sexta-feira “Santa”

Cabeça augusta, que uma luz contorna,
Que há entre mim e o mundo que me faz
(Porque em espinhos a auréola se torna?)
Ansiar a minha morte e a tua paz?

A tua história — Pilatos ou Caifás
Quem tem? São sonhos que o narrar transtorna.
Não é esse o Calvário a que te traz
Tua sina onde todo o fel se entorna.

Não. É em mim que se o Calvário ergueu.
É em meu coração abandonado
Que Ele, cabeça augusta, alto sofreu.

Quem na Cruz onde está ermo e pregado
O pregou? Foi Romano ou foi Judeu?
Bate-me o coração. Meu Deus, fui eu!

(Fernando Pessoa, Poesia (1931–1935 e não datada), p. 126)

27 março 2013

Dia Mundial do Teatro

Três publicações, afora a nossa, nasceram há pouco para a pretensão de serem lidas.
Uma é a «revista de arte» Teatrália, [...]
[...]
A primeira é especialmente adorável.
É proveniente da iniciativa dos alunos da Escola da Arte de Representar. E é ante-simpática ao mero ainda-não leitor dela porque nos enreda logo com uma vantagem — que os alunos da dita escola enquanto escrevem não representam.
O conhecimento da revista é, porém, um pouco ensombrador desta vantagem antevista. É talvez, e apesar de tudo, melhor que os alunos representem.

(Fernando Pessoa, “3”, Crítica, p. 84)

«Sou do tamanho do que vejo» (Peripécia Teatro)

Dia Mundial do Circo

«Estudo para Álvaro de Campos»
Desenho de Cruzeiro Seixas

26 março 2013

121 anos da morte de Walt Whitman (1892)

A magnificent type of poet who will survive by representativeness is Walt Whitman. Whitman has all modern times in him, from cruelty [?] to engineering, from humanitarian tendencies to the hardness of intellectuality — he has all this in him. He is far more permanent than (Schiller or) Musset, for instance. He is the medium of Modern Times. His power of expression is as consummate as Shakespeare’s. [...]

(Fernando Pessoa, “Impermanence”, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, VIII, 45, p. 273;
em inglês no original)



[ Um tipo magnífico de poeta que sobreviverá pela sua representatividade é Walt Whitman. Whitman encerra em si todos os tempos modernos, da crueldade [?] à engenharia, da ternura humanitária à dureza da intelectualidade — tudo isto ele contém em si próprio. É muito mais permanente do que (Schiller ou) Musset, por exemplo. É o veículo dos Tempos Modernos. O seu poder de expressão é tão consumado como o de Shakespeare. [...] ]

(idem, p. 274; trad. Jorge Rosa)

25 março 2013

23 março 2013

Dia Mundial da Meteorologia

Ameaçou chuva. E a negra
Nuvem passou sem mais...

(Fernando Pessoa, Poesia (1902–1917), p. 253)

21 março 2013

Dia Mundial da Floresta

Uma árvore é Deus todo.

(Fernando Pessoa, Poesia (1902–1917), p. 324)

Dia Mundial da Poesia

A inspiração poética é um delírio equilibrado (mas sempre um delírio).

(Alexander Search, Aforismos e afins, p. 60)




É preciso acabar com o mito do poeta inspirado.

(Álvaro de Campos, Aforismos e afins, p. 61)

19 março 2013

Dia do Pai

18 março 2013

169 anos do nascimento de Nikolai Rimsky-Korsakov (1844)

SCHEHERAZAD

(Rimsky Korsakov)

Conta-me contos até não haver
Mais em mim que morrer...
Até que num espaço entre vida e morte
Se passe a minha sorte...

Conta-me contos, lendas, suaves, tanto
Que seja(m) uma só coisa
Elas e o seu indefinido encanto...

[...]

Ah, conta, conta, e a vida esqueça em tudo!
Conta, meus gestos tragam o veludo
De serem só inadequadamente...
Conta... E que ouvindo-te, sem querer,
Como uma música que vem, meu ser
Passe de pertencer ao mundo vão
E fique a ser eternamente
Uma figura num conto teu
Qualquer coisa em teu mundo
Vive só na tua imaginação.

Ah, mais vale sonhar estar-te ouvindo
Que ouvir-te! Conta... Vindo
De ti, os contos passam devagar
E a sua pompa é todo o céu e o ar...

Conta... O silêncio abre alas de cetim
Do teu conto até mim...
Um séquito de sombras é de prata
No que em ti se desata
De pertencer-me e vem até aos dedos
Com que desfolhas esses vãos segredos...

O sultão escutava-te eu a ouvir...
Ouvi a tua voz só por possuir
O sentido oposto do teu conto...
Tudo erra música que te narrava...
[...]

Scheherazad — quantas coisas
Ficaram por contar que tu contaste...
(Fernando Pessoa, Poesia (1902–1917), pp. 345–346)



* 6 de março, segundo o calendário juliano, então em uso na Rússia.

16 março 2013

54 anos da morte de António Botto (1959)

António Botto é o único português, dos que conhecidamente escrevem, a quem a designação de esteta se pode aplicar sem dissonância. Com um perfeito instinto ele segue o ideal a que se tem chamado estético, e que é uma das formas, se bem que a ínfima, do ideal helénico. Segue-o, porém, a par de com o instinto, com uma perfeita inteligência, porque os ideais gregos, como são intelectuais, não podem ser seguidos inconscientemente.
[...]
Se tivermos presentes estas considerações na análise do livro de António Botto, não nos será difícil determinar que esse livro representa uma das revelações mais raras e perfeitas do ideal estético, que se podem imaginar.
[...]

(Fernando Pessoa, “António Botto e o Ideal Estético em Portugal”, Crítica, pp. 173 e 180;
publicado originalmente na revista Contemporânea n.º 3, de Julho de 1922)



Meu querido José Pacheco:

Venho escrever-lhe para o felicitar pela sua Contemporânea, para lhe dizer que não tenho escrito nada, e para pôr alguns embargos ao artigo do Fernando Pessoa.
[...]
Ideal estético, meu querido José Pacheco, ideal estético! Onde foi essa frase buscar sentido? E o que encontrou lá quando o descobriu? Não há ideias nem estéticas senão nas ilusões que nós fazemos deles. O ideal é um mito da acção, um estimulante como o ópio ou a cocaína: serve para sermos outros, mas paga-se caro — com o nem sermos quem poderíamos ter sido.
[...]

(Álvaro de Campos, “De Newcastle-on-Tyne Álvaro de Campos Escreve à Contemporânea”, Crítica,
pp. 186–187; publicado originalmente na revista Contemporânea n.º 4, de Outubro de 1922)

15 março 2013

... que o ministro Vítor Gaspar hoje* não está para ti

Volta amanhã, realidade!

(Álvaro de Campos, Poesia, 140, p. 428)


52 anos dos Massacres de Nambuangongo (Angola), início da Guerra Colonial (1961)

(Malhas que o Império tece!)

(Fernando Pessoa, “O menino da sua mãe”, Poesia (1918–1930), pp. 252–253)

14 março 2013

Eleição do jesuíta argentino Jorge Bergoglio como Papa (Francisco I)

[...] Nem consta que com ela alguém lucrasse, excepto [...] a Companhia de Jesus, que, por processos que não vêm ao caso, conseguiu, através dela, consolidar ainda mais a sua posição junto do Vaticano. Quem quiser conclusões que as tire: estão aqui o poço e o balde.

(Fernando Pessoa, Da República (1910–1935), 150, p. 421)

134 anos do nascimento de Albert Einstein (1879)

homem a tocar violino
«Deus quer, o homem cria, a obra nasce...»*
Pintura de Norberto Nunes


* (Fernando Pessoa, “O Infante”, Mensagem, Segunda Parte, I, p. 127)

13 março 2013

99 anos do «dia triunfal» da vida de Fernando Pessoa (1914) — data alternativa

Eu sou uma antologia.

(Fernando Pessoa, Poesia (1931–1935 e não datada), p. 117)



Abismo de ser muitos! [...]

(idem, p. 472)


Nota: Ver post do dia 13 de Março de 2012 para o texto em que Pessoa apresenta esta data como a do surgimento do heterónimo Alberto Caeiro; ver post do dia 8 de Março de 2010 para o texto em que Fernando Pessoa apresenta uma data alternativa.


Animação a partir de desenhos de Cristiano Sardinha

11 março 2013

Localismo vs. Universalismo

[...] Amar a nossa terra não é gostar do nosso quintal. [...]

(Fernando Pessoa, “Entrevista sobre a Arte e a Literatura Portuguesas”, Crítica, p. 197)

08 março 2013

Dia Internacional da Mulher

[...] The women of Dickens are cardboard and sawdust to pack his men to us on the voyage from the space of dream. The joy and zest of life does not include woman [...].

Dickens’ women are dolls, but all women are dolls. As some thinkers upheld it at Nicea (?), women have no souls. Their existence is bi-dimensional to the tri-dimensional psychism of men. Women are merely ornaments to man’s life — of his life as an animal, as enabling him to satisfy an instinct, of his life as a social being, as enabling him to continue the society he lives in and, working for, creates anew, of his life as an intellectual being as a decorative part of the outer world, with landscapes, china, pictures, old furniture... [...]


(Fernando Pessoa, “Charles Dickens”, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, IX, 8, pp. 308–309;
em inglês no original)



[ [...] As mulheres de Dickens são cartão e serradura para acondicionar os seus homens na viagem desde os espaços oníricos. Na alegria e entusiasmo da vida não há lugar para a mulher [...].

As mulheres de Dickens são bonecas, mas todas as mulheres, afinal, o são. Como alguns pensadores afirmaram em Niceia (?), as mulheres não têm alma. A sua existência é bidimensional comparada com o psiquismo tridimensional do homem. As mulheres são meros ornamentos da vida do homem — da sua vida como animal, na medida em que lhe permite satisfazer um instinto, da sua vida como ser social, na medida em que lhe permite continuar a sociedade em que vive e que recria ao contribuir para ela, da sua vida como ser intelectual, como parte decorativa do mundo externo, com paisagens, louças, quadros, mobiliário antigo... [...] ]


(idem, p. 310; trad. Jorge Rosa)

99 anos do «dia triunfal» da vida de Fernando Pessoa (1914)

O que Fernando Pessoa escreve pertence a duas categorias de obras, a que poderemos chamar ortónimas e heterónimas. Não se poderá dizer que são anónimas e pseudónimas, porque deveras o não são. A obra pseudónima é do autor em sua pessoa, salvo no nome que assina; a heterónima é do autor fora de sua pessoa, é de uma individualidade completa fabricada por ele, como seriam os dizeres de qualquer personagem de qualquer drama seu.

As obras heterónimas de Fernando Pessoa são feitas por, até agora, três nomes de gente — Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos. Estas individualidades devem ser consideradas como distintas da do autor delas. Forma cada uma uma espécie de drama; e todas elas juntas formam outro drama. Alberto Caeiro, que se tem por nascido em 1889 e morto em 1915, escreveu poemas com uma, e determinada, orientação. Teve por discípulos — oriundos, como tais, de diversos aspectos dessa orientação — aos outros dois: Ricardo Reis, que se considera nascido em 1887, e que isolou naquela obra, estilizando, o lado intelectual e pagão; Álvaro de Campos, nascido em 1890, que nela isolou o lado por assim dizer emotivo, a que chamou «sensacionista», e que — ligando-o a influências diversas, em que predomina, ainda que abaixo da de Caeiro, a de Walt Whitman — produziu diversas complicações, em geral de índole escandalosa e irritante, sobretudo para Fernando Pessoa, que em todo o caso não tem remédio senão fazê-las e publicá-las, por mais que delas discorde. As obras destes três poetas formam, como se disse, um conjunto dramático; e está devidamente estudada a entreacção intelectual das personalidades, assim como as suas próprias relações pessoais. Tudo isto constará de biografias a fazer, acompanhadas, quando se publiquem, de horóscopos e, talvez, de fotografias. É um drama em gente, em vez de em actos.

(Se estas três individualidades são mais ou menos reais que o próprio Fernando Pessoa — é problema metafísico, que este, ausente do segredo dos Deuses, e ignorando portanto o que seja realidade, nunca poderá resolver.)

(Fernando Pessoa, “Tábua Bibliográfica — Fernando Pessoa”, Crítica, pp. 404–405)



Em torno do meu mestre Caeiro havia, como se terá depreendido destas páginas, principalmente três pessoas — o Ricardo Reis, o António Mora e eu. [...]

O Ricardo Reis era um pagão latente, desentendido da vida moderna e desentendido daquela vida antiga, onde deveria ter nascido — desentendido da vida moderna porque a sua inteligência era de tipo e qualidade diferente; desentendido da vida antiga porque a não podia sentir, pois se não sente o que não está aqui. [...]

O António Mora era uma sombra com veleidades especulativas. Passava a vida a mastigar Kant e tentar ver com o pensamento se a vida tinha sentido. [...]

Por mim, antes de conhecer Caeiro, eu era uma máquina nervosa de não fazer coisa nenhuma. Conheci o meu mestre Caeiro mais tarde que o Reis e o Mora, que o conheceram, respectivamente, em 1912 e 1913. Conheci Caeiro em 1914. Já tinha escrito versos — três sonetos e dois poemas («Carnaval» e «Opiário»). Esses sonetos e estes poemas mostram o que eu sentia quando estava sem amparo. Logo que conheci Caeiro, verifiquei-me. Cheguei a Londres e escrevi imediatamente a «Ode Triunfal». E de aí em diante, por mal ou por bem, tenho sido eu.

Mais curioso é o caso do Fernando Pessoa, que não existe, propriamente falando. Este conheceu Caeiro um pouco antes de mim — em 8 de Março de 1914, segundo me disse. Nesse mês, Caeiro viera a Lisboa passar uma semana e foi então que o Fernando o conheceu. Ouviu ler O Guardador de Rebanhos. Foi para casa com febre (a dele), e escreveu, num só lance ou traço, a «Chuva Oblíqua» — os seis poemas.

(Álvaro de Campos, “Notas para a Recordação do Meu Mestre Caeiro”, 8,
Poemas Completos de Alberto Caeiro, pp. 161–162)

06 março 2013

Iconografia pessoana

Ilustração de Helder Oliveira
para a revista Actual (Expresso)

04 março 2013

619 anos do nascimento do Infante D. Henrique (1394)

AO INFANTE


Senhor, a obra fica e o homem passa.
Mas a obra é o homem. Só estas canções
No fundo incerto e oceânico da raça
E anónimos, longes corações.
Em torno de mim, se de mim mesmo corro
O som ruído da onda e as praias toco
Do Largo no abismo do meu ser,
Pairam as naus perdidas que encontraram
O por-achar e em mares se abismaram
Para além do Regresso e do Esquecer.

Parte quem fica quando a Alma manda.
Em mil naus a Vossa alma reviveu
E no universo, de uma a outra banda
Do que se achou e que se conheceu,
Vossa Presença Eterna violou
As portas de ouro com que Deus fechou
O oriente de luz e o ocaso morto...
Vosso espírito ainda nos consuma
E obre as novas naus em nós a suma
Vitória de não quererem nunca o porto.

(Fernando Pessoa, Poesia (1918–1930), p. 172)

02 março 2013

94 anos da fundação da Terceira Internacional Comunista (1919)

[...] foram[-me] sempre origem de repugnância e asco todas as formas do internacionalismo, que são três: a Igreja de Roma, a finança internacional e o comunismo.

(Fernando Pessoa, Pessoa por Conhecer, vol. II, 67, p. 88)

01 março 2013

21 anos do início da Guerra da Bósnia (1992)

Of the Balkan peoples the least said the better; they have no pretension even to being civilized. Their very strength is that of uncivilized people — their qualities of combativeness, [...]

(Fernando Pessoa, Pessoa Inédito, 168, p. 298; em inglês no original)



[ Dos povos Balcânicos quanto menos se disser melhor; eles não têm mesmo nenhuma pretensão a ser civilizados. A sua verdadeira força é a do povo incivilizado — as suas qualidades de combatividade; [...] ]

(idem, p. 299)

Pessoa, sempre — todos os dias: Março de 2013

Calendário pessoano: Março de 2013

Os ícones de cada dia foram adaptados dos do Labirinto do site MultiPessoa.

28 fevereiro 2013

Craques de futebol
(nos 109 anos da fundação do Sport Lisboa e Benfica — 1904)

Arre, estou farto de semi-deuses!

(Álvaro de Campos, “Poema em linha recta”, Poesia, 41, p. 263)

27 fevereiro 2013

Deus e a incompletude

Deus é o existirmos e isto não ser tudo.

(Bernardo Soares, Livro do Desassossego, 22, p. 60)

25 fevereiro 2013

158 anos do nascimento de Cesário Verde (1855)

There is a great Portuguese poet called Cesário Verde; he lived in the middle years of the nineteenth century. The whole attitude to life which makes him a great poet can actually be found in anticipation in two casual poems of Guilherme Braga, a poet ten years older than he. But what in Cesário is gathered together into a whole concept of the universe was a mere chance in Braga’s production. And, even if, as is quite probable, Braga’s casual poems made Cesário find himself, even if by a plagiarism without plagiarism, the earlier man is nevertheless smaller. (It is the later man who is the earlier.)

(Fernando Pessoa, “Erostratus”, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, VIII, 6, p. 174;
em inglês no original)



[ Há um grande poeta português chamado Cesário Verde; viveu ele em meados do século XIX. Toda a atitude perante a vida que faz de Cesário Verde um grande poeta se encontra antecipadamente em dois poemas casuais de Guilherme Braga, poeta dez anos mais velho do que ele. Mas aquilo que em Cesário se congrega em todo um conceito do universo era mero acaso na produção de Braga. E mesmo que, como é muito provável, fossem os poemas casuais de Braga que fizeram com que Cesário se encontrasse a si próprio, embora à custa de um plagiato sem plagiato, o poeta anterior é, no entanto, de menor estatura. (O poeta posterior é que fica sendo o primeiro.) ]

(idem, p. 221; trad. Jorge Rosa, com alterações)

23 fevereiro 2013

O mal da felicidade

Evil is everywhere on earth, and one of its forms is happiness.

[ O mal está por toda a Terra e uma das suas formas é a felicidade. ]

(Fernando Pessoa, Aforismos e afins, p. 19; em inglês no original)

21 fevereiro 2013

165 anos do Manifesto do Partido Comunista (1848)

[...] A humanidade tem-se entretido — desde a formação, na Grécia antiga, do espírito crítico — a idear sistemas políticos e sociais «definitivos» em matéria tão flutuante e incerta como a vida, em assunto ainda tão fora da ciência como a sociedade.

(Fernando Pessoa, “Régie, Monopólio, Liberdade”, Crítica, p. 281)

88 anos da publicação do primeiro número da revista The New Yorker (1925)

Livro com a inscrição 'Pessoa' na capa
The New Yorker, edição de 16&23 de Junho de 2003 (p. 101)
Ilustração de autor não identificado

19 fevereiro 2013

Ranço

O ancien régime intelectual ainda hoje pesa sobre nós.

(Ricardo Reis, Prosa, 74, p. 243)

17 fevereiro 2013

16 fevereiro 2013

Ecletismo

[...] Se eu gostasse só da minha arte, nem da minha arte gostava, porque vario.

(Álvaro de Campos, “De Newcastle-on-Tyne Álvaro de Campos Escreve à Contemporânea”, Crítica, p. 187)

14 fevereiro 2013

Dia dos Namorados

Não sei se é amor que tens, ou amor que finges,
O que me dás. Dás-mo. Tanto me basta.
Já que o não sou por tempo,
Seja eu jovem por erro.
Pouco os deuses nos dão, e o pouco é falso.
Porém, se o dão, falso que seja, a dadiva
É verdadeira. Aceito,
Cerro olhos: é bastante.


(Ricardo Reis, Poesia, II, 112, pp. 118–119)



Fotografia de Ofélia Queirós (1900–1991)

13 fevereiro 2013

68 anos do início do bombardeamento de Dresden (1945)

A criança loura
Jaz no meio da rua.
Tem as tripas de fora
E por uma corda sua
Um comboio que ignora.

(Fernando Pessoa, Poesia (1902–1917), pp. 213–214)

94 anos do fim da “Monarquia do Norte”, com a entrada das forças republicanas no Porto (1919)

[...] [Ricardo Reis] vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente por ser monárquico. [...]

(Fernando Pessoa, Correspondência (1923–1935), 162, p. 345)

11 fevereiro 2013

155 anos da primeira “aparição” de Lourdes (1858)

Quais milagres de Lourdes, meu amigo!
Milagres de Rússia.
Curar paralisias!

Curar egoísmos, isso é que é milagre.
Ah Lourdes, Lourdes, quantas Lourdes há!

(Fernando Pessoa, Poesia (1918–1930), p. 198)

09 fevereiro 2013

Fevereiro, “mês dos gatos”

Stencil: «Gato que brincas na rua — Fernando Pessoa. O Gato»
Stencil e fotografia de autores não identificados


Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.

Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes,

És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.

(Fernando Pessoa, Poesia (1931–1935 e não datada), pp. 14–15)

06 fevereiro 2013

405 anos do nascimento de Padre António Vieira (1608)

Na palavra falada temos que ser, em absoluto, do nosso tempo e lugar; não podemos falar como Vieira, pois nos arriscamos ou ao ridículo ou à incompreensão. [...]

A palavra escrita, ao contrário, não é para quem a ouve, busca quem a ouça; escolhe quem a entenda, e não se subordina a quem a escolhe.

Na palavra escrita tem tudo que estar explicado, pois o leitor nos não pode interromper com o pedido de que nos expliquemos melhor.

(Fernando Pessoa, “Ortografia”, Pessoa Inédito, 114, pp. 243–244)

04 fevereiro 2013

214 anos do nascimento de Almeida Garrett (1799)

[...] the sum and whole of Portuguese literature is hardly literature and scarcely ever Portuguese. It is Provençal, Italian, Spanish and French, occasionally English, in some people, like Garrett, who knew enough French to read bad French translations of inferior English poems and go right when they go wrong on that. [...]

(Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, 140; em inglês no original)



[ [...] o conjunto da literatura portuguesa dificilmente é literatura e quase nunca é portuguesa. É provençal, italiana, espanhola e francesa, ocasionalmente inglesa, em alguns, como Garrett, que sabia o francês bastante para ler más traduções francesas de poemas ingleses inferiores e acertar quando eles erram. [...] ]

(idem, 148)

03 fevereiro 2013

525 anos do desembarque de Bartolomeu Dias na Aguada de São Brás (Mossel Bay) após dobrar o Cabo das Tormentas, ou da Boa Esperança (1488)

Ilustração de Pedro Sousa Pereira
para a edição de Mensagem pela Oficina do Livro (2006)


02 fevereiro 2013

Dia Mundial das Zonas Húmidas

PAUIS


Pauis que roçarem ânsias pela minh’alma em ouro...
Dobre longínquo de Outros Sinos... Empalidece o louro
Trigo na cinza do poente... Corre um frio carnal por minh’alma...
Tão sempre a mesma, a Hora!... Baloiçar de cimos de palma...
Silêncio que as folhas fitam em nós... Outono delgado
Dum canto de vaga ave... Azul esquecido em estagnado...
Oh que mudo grito de ânsia põe garras na Hora!
Que pasmo de mim anseia por outra coisa que o que chora!
Estendo as mãos para além, mas ao estendê-las já vejo
Que não é aquilo que quero aquilo que desejo...
Címbalos de Imperfeição... Ó tão antiguidade
A hora expulsa de si-Tempo!... Onda de recuo que invade
O meu abandonar-me a mim próprio até desfalecer,
E recordar tanto o Eu presente que me sinto esquecer!...
Fluido de auréola, transparente de Foi, oco de ter-se...
O Mistério sabe-me a eu ser outro... Luar sobre o não conter-se...
A sentinela é hirta — a lança que finca no chão
É mais alta do que ela... Pra que é tudo isto?... Dia chão...
Trepadeiras de despropósito lambendo de Hora os Aléns!
Horizontes fechando os olhos ao espaço em que são elos de erro...
Fanfarras de ópios de silêncios futuros... Longes trens...
Portões vistos longe... através das árvores... tão de ferro!...

(Fernando Pessoa, Poesia (1902–1917), pp. 213–214)

01 fevereiro 2013

Pessoa, sempre — todos os dias: Fevereiro de 2013

Calendário pessoano: Fevereiro de 2013

Os ícones de cada dia foram adaptados dos do Labirinto do site MultiPessoa.

30 janeiro 2013

Raciocínio

Continua o Fernando Pessoa com aquela mania, que tantas vezes lhe censurei, de julgar que as coisas se provam. Nada se prova senão para ter a hipocrisia de não afirmar. O raciocínio é uma timidez — duas timidezes talvez, sendo a segunda a de ter vergonha de estar calado.

(Álvaro de Campos, “De Newcastle-on-Tyne Álvaro de Campos Escreve à Contemporânea”,
Crítica, pp. 186–187)

28 janeiro 2013

99 anos da criação de Ricardo Reis (1914)*

Vivem em nós inúmeros;
Se penso ou sinto, ignoro
Quem é que pensa ou sente.
Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.

Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu escrevo.

(Ricardo Reis, Poesia, II, 149, pp. 137–138)


«Ricardo Reis»
Pintura de Juan Soler


* Fernando Pessoa hesita entre 28 e 29

25 janeiro 2013

10 anos da abertura da loja maçónica do Grande Oriente Lusitano à comunicação social (2003)

O segundo erro dos anti-maçons consiste em não querer ver que a Maçonaria, unida espiritualmente, está materialmente dividida, como já expliquei. A sua acção social varia de país para país, de momento histórico para momento histórico, em função das circunstâncias do meio e da época, que afectam a Maçonaria como afectam toda a gente. A sua acção social varia, dentro do mesmo país, de Obediência para Obediência, onde houver mais que uma, em virtude de divergências doutrinárias — as que provocaram a formação dessas Obediências distintas, pois, a haver entre elas acordo em tudo, estariam unidas. Segue de aqui que nenhum acto político ocasional de nenhuma Obediência pode ser levado à conta da Maçonaria em geral, ou até dessa Obediência particular, pois pode provir, como em geral provém, de circunstâncias políticas de momento, que a Maçonaria não criou.

Resulta de tudo isto que todas as campanhas anti-maçónicas — baseadas nesta dupla confusão do particular com o geral e do ocasional com o permanente — estão absolutamente erradas, e que nada até hoje se provou em desabono da Maçonaria. Por esse critério — o de avaliar uma instituição pelos seus actos ocasionais porventura infelizes, ou um homem por seus lapsos ou erros ocasionais — que haveria neste mundo senão abominação? Quer o Sr. José Cabral que se avaliem os papas por Rodrigo Bórgia, assassino e incestuoso? Quer que se considere a Igreja de Roma perfeitamente definida em seu íntimo espírito pelas torturas dos Inquisidores (provenientes de um uso profano do tempo) ou pelos massacres dos albigenses e dos piemonteses? E contudo com muito mais razão se o poderia fazer, pois essas crueldades foram feitas com ordem ou com consentimento dos papas, obrigando assim, espiritualmente, a Igreja inteira.

Sejamos, ao menos, justos. Se debitamos à Maçonaria em geral todos aqueles casos particulares, ponhamos-lhe a crédito, em contrapartida, os benefícios que dela temos recebido em iguais condições. Beijem-lhe os jesuítas as mãos, por lhes ter sido dado acolhimento e liberdade na Prússia, no século dezoito — quando expulsos de toda a parte, os repudiava o próprio Papa — pelo maçon Frederico II. Agradeçamos-lhe a vitória de Waterloo, pois que Wellington e Blucher eram ambos maçons. Sejamos-lhe gratos por ter sido ela quem criou a base onde veio a assentar a futura vitória dos Aliados — a Entente Cordiale, obra do maçon Eduardo VII. Nem esqueçamos, finalmente, que devemos à Maçonaria a maior obra da literatura moderna — o Fausto, do maçon Goethe.


(Fernando Pessoa, “Associações Secretas”, Da República (1910–1935), 132, pp. 403–404)

23 janeiro 2013

Iconografia pessoana

Desenho de Osvalter

21 janeiro 2013

Produtividade nacional

[...] We do not work enough and we pretend to work too much. [...]

(Fernando Pessoa, “Erostratus”, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, VIII, 35, p. 207;
em inglês no original)



[ [...] Não trabalhamos bastante e fingimos que trabalhamos demasiado. [...] ]

(idem, p. 256; trad. Jorge Rosa)

20 janeiro 2013

71 anos da adopção da “Solução Final para o Problema Judaico” (1942)

Germany, properly speaking, is not civilized also. It has gone the wrong way, but it has gone organisedly on that wrong way.

(Fernando Pessoa, Pessoa Inédito, 168, p. 298; em inglês no original)



[ A Alemanha, propriamente falando, também não é civilizada. Tomou o caminho errado, mas caminhou organizadamente nesse caminho errado. ]

(idem, p. 299)

116 anos da partida de Fernando Pessoa com a mãe para a África do Sul (1896)

«Durban»
Pintura de Juan Soler

19 janeiro 2013

94 anos do início da “Monarquia do Norte” (1919)

[...] Fixemos isto: ser monárquico é, hoje, em Portugal, ser traidor à alma nacional e ao futuro da Pátria Portuguesa. [...]

(Fernando Pessoa, “Reincidindo...”, Crítica, p. 34)

18 janeiro 2013

142 anos da proclamação do II Reich Alemão (1871)

[...] a tradição do velho império alemão alimentou aqueles românticos alemães modernos por quem o orgulho alemão, renascendo, veio, nas mãos de Bismarck, a criar o grande império actual; [...]

(Fernando Pessoa, “Ibéria”, Ultimatum e Páginas de Sociologia Política, 25, p. 192)

16 janeiro 2013

67 anos da declaração de “Santo” António de Lisboa como Doutor da Igreja (1946)

Santo António de Lisboa
Era um grande pregador,
Mas é por ser Santo António
Que as moças lhe têm amor.

(Fernando Pessoa, Quadras, II, 201, p. 105)

14 janeiro 2013

Iconografia pessoana

[in]cult®PaperToys da CultIdeias
(Fernando Pessoa para cortar, colar e montar)

13 janeiro 2013

254 anos da execução dos condenados no Processo dos Távoras (1759)

[...] Oh, how I dream of that Marquis of Tavora who should come and redeem the nation — a saviour, a true man, great and hold that would put us right. But no suffering can equal that when I bring myself to understand that this is no more than a dream.

(Fernando Pessoa, Pessoa por Conhecer, vol. II, 49, p. 76; em inglês no original)




[ [...] Oh, como eu sonho com aquele Marquês de Távora que poderia vir redimir a nação — um salvador, um verdadeiro homem, grande e dominador que nos endireitaria. Mas nenhum sofrimento pode igualar aquele que me leva a perceber que isto não é mais do que um sonho. ]

(idem, p. 77)

11 janeiro 2013

127 anos do início do primeiro campeonato mundial de xadrez (1886)

XADREZ


Peões, saem na noite sossegada,
Cansados, cheios de emoções postiças,
Vão para casa, conversando em nada,
Sob peles, e casacos, e peliças.

Peões a que o destino não concede
Mais que uma casa por avanço e sorte,
Salvo se a diagonal lhes outra cede,
Ganhando o novo, com a alheia morte.

Súbditos sempre da maior mudança
Das nobres peças que ou o Bispo ou a Torre
Subitamente a sorte lhes alcança
E no isolado avanço o peão morre.

Um ou outro, chegando ao fim, consegue
O resgate do que é outro do que ele;
E o jogo, alheio a cada peça, segue,
E a inexorável mão por junto impele.

Depois, coitados, sob peliça ou renda,
Mate! Se finda o jogo e a mão delgada
Guarda as peças sem nexo da contenda,
Que, como tudo é jogo, o fim é nada.

(Fernando Pessoa, Poesia (1918–1930), pp. 279–280)

5 anos da morte de Edmund Hillary (2008)

[...] Nas faldas do Himalaia o Himalaia é só as faldas do Himalaia. É na distância, ou na memória, ou na imaginação que o Himalaia é da sua altura, ou talvez um pouco mais alto. [...]

(Fernando Pessoa, “Entrevista sobre a Arte e a Literatura Portuguesas”, Crítica, p. 198)

09 janeiro 2013

Iconografia pessoana

«Fernando Pessoa de Almada a Costa Pinheiro»
Pintura de Carlos Carreiro (1983)

07 janeiro 2013

688 anos da morte de D. Dinis (1325)

Conhece-se a poesia lírica pelo facto de ser quase desprezível a ideação ou o sentimento para existir uma boa poesia lírica. Assim o «Ai flores, ai flores do verde pino» ou o «Levantou-se a velida» de D. Dinis, rei de Portugal, são poesias líricas maravilhosas, conquanto contenham uma insignificante base ideativa ou mesmo emocional. É o lirismo puro. Claro está que, dentro deste lirismo, a poesia será tanto maior quanto mais ideia e emoção contém. [...]

(Fernando Pessoa, Pessoa Inédito, 237, p. 383)

05 janeiro 2013

Prazeres de Inverno...

Haja inverno na terra, não na mente,
E, amor a amor, ou livro a livro, amemos
Nossa lareira breve.

(Ricardo Reis, Poesia, II, 110, p. 117)

03 janeiro 2013

Um dia aleatório...

Every day the papers bring me news of facts that are humiliating, [] to us, the Portuguese.

(Fernando Pessoa, Pessoa por Conhecer, vol. II, 49, p. 76; em inglês no original)



[ Todos os dias os jornais me trazem notícias de factos que são humilhantes, [] para nós, Portugueses. ]

(idem, p. 77)

01 janeiro 2013

Dia de Jano, divindade dos princípios e das transições

Aguarela de Hermenegildo Sábat
(Fonte: Público)

Ano Novo

Nada começa: tudo continua.
Onde estamos, que vemos só passar?
O dia muda, lento, no amplo ar;
Múrmura, em sombras, flui a água nua.

Vêm de longe,
Só nosso vê-las teve começar.
Em cadeias do tempo e do lugar,
É abismo o começo e ausência.

Nenhum ano começa. É Eternidade!
Agora, sempre, a mesma eterna Idade,
Precipício de Deus sobre o momento,

Na curva do amplo céu o dia esfria,
A água corre mais múrmura e sombria
E é tudo o mesmo: e verbo o pensamento.

(Fernando Pessoa, “Começa Hoje o Ano”, Poesia (1918–1930), p. 187)

Pessoa, sempre — todos os dias: Janeiro de 2013

Calendário pessoano: Janeiro de 2013

Os ícones de cada dia foram adaptados dos do Labirinto do site MultiPessoa.